terça-feira, janeiro 12, 2010

O que aconteceu com o Promic?

"Há uma notória quebra de comunicação entre o desejo de participação dos produtores culturais e a gestão do edital."




O resultado do Edital de Projetos Independentes do Promic, divulgado nas vésperas do Natal, afeta o sistema cultural conquistado em Londrina, que tem como ponto alto justamente a implantação do Promic, em 2003.

O que salta aos olhos é que desde o início do Promic, pela primeira vez apenas 19 projetos foram aprovados. Sobraram recursos no edital em maior monta que os recursos previstos nos projetos aprovados. Cerca de R$ 400 mil foram destinados aos 19 projetos e mais de R$ 500 mil “sobraram”.

Em todos os anos anteriores, quando chegava a etapa final da análise dos Projetos Independentes, os recursos de cerca de R$ 1 milhão não eram suficientes para aprovar todos os bons projetos que estavam inscritos e habilitados (com a documentação correta). Era sempre uma tristeza ter que deixar de fora vários bons projetos. Algo bem diferente de sobrar recursos.

O que foi informado até agora pela Secretaria de Cultura é que houve mudanças em algumas regras, que não foram percebidas pelos produtores culturais e por essa razão grande parte dos projetos foi inabilitada. Quais as novas regras? A Comissão modificou sua “leitura” dos critérios de análise de mérito dos projetos? Essas são perguntas tamborilando na cabeça dos que se ocupam da criação cultural em Londrina e aguardam informações.

Desde11 de janeiro estão divulgados os pareceres sobre a reprovação dos projetos e podemos saber melhor o que levou a tantas reprovações. Porém, mesmo sem detalhes é possível dizer que algo está muito errado se a inabilitação de projetos, ao invés de atingir uma minoria (15% já seria muito) acabou inabilitando a maioria. Há uma notória quebra de comunicação entre o desejo de participação dos produtores culturais e a gestão do edital.

O agir comunicativo é um dos pilares de uma democracia de profundidade e pressupõe localizar interesses mútuos, negociar consenso quando há pontos divergentes e aplicar regras com clareza. Jürgen Habermas, um dos principais pensadores do agir comunicativo, chama de “comunicativas” as interações nas quais as pessoas envolvidas se põem de acordo para coordenar seus planos de ação e esse acordo implica num reconhecimento das pretensões das partes e de sua validez.

Evidente que, se regras novas foram instituídas no edital e levaram a tantas reprovações de projetos, não estavam suficientemente reconhecidas pela comunidade cultural. Igualmente evidente que se a Comissão de Análise aplicou critérios e regras de modo diferente de antes, quebrou a legitimidade do rito de análise, formado nos anos anteriores de existência do edital, nas conferências de cultura, no trabalho da Incubadora de Projetos Culturais e na realização de oficinas de elaboração de projetos, onde as diretrizes foram discutidas entre a Secretaria de Cultura e os produtores culturais.

Diz Habermas que as normas, para terem e manterem sua validez, dependem de que as relações interpessoais ordenadas de maneira legítima não deixem de ser produzidas, pois perdem seu sentido se tomarem rumos tais que os atores envolvidos não sejam mais capazes de seguir ou satisfazer as normas – tal qual aconteceu no caso do edital do Promic.

A Secretaria de Cultura já anunciou a abertura de um novo edital para este começo de ano, utilizando o recurso que “sobrou” do edital anterior. Mas é preciso também uma avaliação sobre o que aconteceu. Muitos produtores culturais estão partindo para um comportamento reprimido, pensando em obrigatoriamente adequar-se às novas regras para ter seus projetos aprovados. Se ninguém chamar o debate, o que vai acontecer é que o Promic vai perder sua força principal: ter sido um modelo de fomento cultural montado junto com os produtores culturais e somando suas ações na realização de uma política cultural para a população da cidade.

Faço uma sugestão: que a Secretaria de Cultura faça um apanhado dos principais motivos de inabilitações e reprovações e leve o assunto ao Conselho Municipal de Cultura, numa reunião com participação dos integrantes da Comissão, para juntos fazerem um balanço sincero, tendo como principal objetivo ampliar a gestão comunicativa dos editais.

A filósofa e socióloga Marilena Chauí diz que “na medida em que a democracia afirma a igualdade política dos cidadãos, afirma por isso mesmo que todos são igualmente competentes em política”. Reconhecer a competência do cidadão quer dizer que, havendo oportunidades de participação, todos podem realizar de fato a igualdade que a democracia reconhece de direito.




Abraços à todos


Dentinho


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