Adailton Alves[2]
*texto originalmente publicado no blog Teatro de Rua e a Cidade

Para Patrice Pavis no Dicionário de Teatro (2003: 172-3), a forma teatral está em diversos níveis: no plano concreto, isto é, no lugar cênico e na expressão corporal; no nível abstrato, dramaturgia e fábula; e nas ações e nos elementos discursivos, como as palavras, sons, ritmos etc. Assim, a forma teatral para Pavis, é complexa, no entanto, ela só existe se há algo para ser enformado, posto na forma: "Uma forma teatral não existe em si; ela só faz sentido dentro de um projeto cênico global, isto é, quando se associa a um conteúdo transmitido ou a transmitir." Diante do exposto, fica claro que o conteúdo, se não determina, é responsável ao menos por parte da estruturação da forma, isto é, novos conteúdos necessitam de novas formas. E aqui é possível lembrarmos o rompimento do drama burguês e o surgimento do épico como já foi discutido por Peter Szondi e Anatol Rosenfeld, para citarmos apenas dois. Estaríamos vivenciando a necessidade de novas formas, ou os conteúdos ainda são os mesmos daqueles do fim do século XIX e do século passado? Ou mesmo não sendo os mesmos conteúdos daquela época, a forma épica, que surgiu naquele período, ainda daria conta de nossos conteúdos?
Ernst Fischer no livro A necessidade da arte (1973: 143) define a forma como algo que quer perdurar no tempo, enquanto o conteúdo quer sempre avançar:
O que chamamos forma é o relativo estado de equilíbrio de uma determinada organização, numa determinada disposição da matéria; é a expressão da tendência fundamental conservadora, da estabilização temporária de condições materiais. O conteúdo necessariamente se transforma: às vezes imperceptivelmente, às vezes em ação violenta. O conteúdo entra em conflito com a forma, fá-la explodir, e cria novas formas nas quais o conteúdo transformado encontra, por sua vez, nova e temporária expressão estável.
Para Fischer a forma é equilíbrio, enquanto o conteúdo é transformação, por isso a forma é conservadora, enquanto o conteúdo é revolucionário. Desse ponto de vista nos deparamos com o seguinte: se a história é o eterno devir, se tivermos uma arte que se pauta nesse devir, estará sempre se transformando, logo, necessitando de novas formas. Mas, do ponto de vista teatral, nos parece que a forma épica ainda cabe qualquer conteúdo. Em tempos de globalização, com o capitalismo em constante mutação faz-se necessário atentarmos sempre ao conteúdo do que produzimos. Quanto ao espaço cênico que ocupamos, a rua, é épica por definição, no entanto, ela é também forma/conteúdo e está contida na cidade que é também forma/conteúdo. Como aliar nossos conteúdos numa forma adequada, sendo que a mesma entrará em contato com outras formas/conteúdos que, por sua vez, modificará forma e até mesmo nosso conteúdo? Pois sevamos abertos para a rua, visando uma troca de experiência, o contato com o público nesse espaço pode até mesmo criar uma outra obra.
Nas últimas décadas temos vividos sob o primado da forma e o esvaziamento do conteúdo, ao mesmo tempo muitos foram os conceitos criados sob o signo do pós-modernismo: teatro pós-dramático (para Iná Camargo Costa uma usurpação do conceito do épico); processo colaboracionista em oposição ao teatro coletivo, ainda que seja difícil entender suas diferenças; work in progress etc. Estamos apenas criando novos conceitos ou nos encaminhando para novas formas? E as novas tecnologias, as ditas novas mídias? Estas vêm, aos poucos, apagando a ideia de artistas (no sentido da divisão social do trabalho, isto é, de um especialista) e público, já que com essas ferramentas todos podem criar e ao mesmo tempo compartilhar com todos em tempo real. A tecnologia, em sendo suporte, em que medida influencia no conteúdo e não apenas na forma de nosso fazer teatral? Por fim, cabe ressaltar que a própria materialidade das obras tem desaparecido, ocupam cada vez a rede mundial de computadores, por exemplo.
Assim, tanto sua forma, quanto seu conteúdo, bem como sua fruição são virtuais. Desse ponto de vista, a relação direta entre o artista e o público, entre o fruidor e a obra estaria desaparecendo?Muitas são as questões e poucas são as respostas. Mas, de certa forma, o que deve orientar o nosso conteúdo são sempre as questões que nos pauta: de onde falamos e com quem dialogamos? De que lado estamos na luta travada na sociedade capitalista?
--------------------------------------------------------------------------------
[1]Texto provocação, criado para a abertura do Café Teatral ocorrido em 14/06/11.
[2]Ator do Buraco d`Oráculo, mestrando em artes e integrante do Núcleo de Pesquisadores de Teatro de Rua.
--------------------------------------------------------------------------------
[1]Texto provocação, criado para a abertura do Café Teatral ocorrido em 14/06/11.
[2]Ator do Buraco d`Oráculo, mestrando em artes e integrante do Núcleo de Pesquisadores de Teatro de Rua.
Nenhum comentário:
Postar um comentário